Até o momento, não há cura ou um tratamento que impeça a evolução da doença de Alzheimer. As terapias, com certo nível de sucesso comprovado, conseguem apenas aliviar os sintomas, retardar a evolução do quadro clínico e atenuar o desconforto provocado por esta enfermidade, que leva à perda de memória e ao declínio cognitivo. O alcance destas abordagens também é maior nos estágios iniciais da doença. A longo prazo, a progressão dos sintomas é inevitável.
Para combater a doença de Alzheimer e outras demências, os cientistas seguem incansáveis com as pesquisas e os estudos em diversas frentes: as novas formas de diagnóstico, as terapias para reverter a enfermidade já instalada e, sobretudo, a prevenção.
O bioquímico e cientista português Prof. Dr. Tiago Fleming Outeiro é um dos grandes estudiosos em doenças neurodegenerativas do momento. Professor catedrático e diretor do Departamento de Neurodegeneração na Universidade de Medicina Gotiingen, na Alemanha, Dr. Tiago dedica-se a estudar a origem de doenças neurodegenerativas e, assim, os novos caminhos para tratá-las. A seguir, ele fala sobre as terapias e a esperança.
Thereus Health – O que é possível fazer para evitar o desenvolvimento da doença de Alzheimer?
Prof. Tiago Outeiro – Nós não temos, neste momento, uma terapia ou um fármaco que trave a doença ou evite o seu aparecimento. Nós sabemos, hoje, que há alguns comportamentos que ajudam a reduzir o risco de um indivíduo desenvolver a enfermidade e a retardar a evolução nos casos já comprovados.
O exercício físico regular é fundamental, assim como a alimentação equilibrada e os cuidados com o sono e o descanso.
A reserva cognitiva também é importante. Isto está relacionado ao nível de educação. Quanto mais alto o nível educativo, maior é a plasticidade do cérebro. Ou seja, se ao longo da vida, tivermos uma atividade intelectual mais ativa e uma educação mais profunda, que nos permitem trabalhar o cérebro com maior intensidade, ele suporta melhor as eventuais perdas que uma enfermidade possa ocasionar. Faço uma analogia com os músculos, embora o cérebro não seja um músculo. Quanto mais nos exercitamos, mais fortes e maiores os músculos ficam. Com os neurónios, o benefício é semelhante. Quanto mais trabalhamos os neurónios, mais conectados e ativos eles ficam para combater as doenças neurodegenerativas.
Não raramente, nós ouvimos que é preciso praticar atividades como o jogo Sudoku. Vale enfatizar que apenas um tipo de jogo não proporciona o resultado que nós esperamos. O estímulo tem que ser variado e rico. A vida social também é importante. Ou seja, o cérebro deve ser estimulado de diversas formas. Assim, os neurónios podem potencializar a conexão no cérebro, para que a perda futura da função neural seja retardada.
Thereus Health – O que evoluiu em termos de tratamento nos últimos anos?
Prof. Tiago Outeiro – Não houve tanta evolução quanto nós gostaríamos. Várias hipóteses foram investigadas, mas nada que chegasse às farmácias e ao mercado. Porém, obtivemos sucessos recentes, que envolvem as pesquisas e indicam que nós estamos na pista correta. Recentemente, a imunoterapia com os anticorpos demonstrou resultados bem promissores. A indústria farmacêutica está animada e otimista, o que traz mais esperança para todo mundo. Quando uma descoberta é comprovada neste cenário, pode haver um investimento maior para que novas terapêuticas sejam desenvolvidas.
Paralelamente, também há progresso nas pesquisas sobre a doença de Alzheimer. Mas, pode demorar muito tempo até que essas pesquisas possam ser traduzidas em condutas clínicas. A mensagem, no entanto, é positiva. Nós não dispomos de terapias que gostaríamos de ter, contudo nós avançamos vários passos que nos dão pistas para os próximos anos de investigação.
Thereus Health – Há alguma intervenção comprovadamente eficiente para evitar o declínio cognitivo, tanto em pacientes como na população saudável?
Prof. Tiago Outeiro – A melhor intervenção, atualmente, é manter-se ativo, tanto mental como fisicamente. Nada vai deter a doença, mas vai retardá-la – e isto é um benefício comprovado cientificamente.
Thereus Health – Nas pesquisas em curso, há a procura por algo que modifique a evolução da doença já comprovada?
Prof. Tiago Outeiro – A esperança é grande. Os ensaios clínicos com a imunoterapia, citada acima, foram realizados com indivíduos doentes. Se estas terapias confirmarem-se eficazes, a enfermidade não vai reverter, mas retardar.
Nós precisamos também trabalhar no diagnóstico, para que ele se realize o quanto antes. Se nós tratarmos a doença mais rapidamente, a perda cognitiva será menor. Ao unir as novas terapias ao diagnóstico precoce, a esperança renova-se.
Thereus Health – Por fim, onde está a esperança para o doente de Alzheimer?
Prof. Tiago Outeiro – Nós temos esperança em diversas áreas. Há avanços em diagnósticos com melhores possibilidades de detectar o comprometimento cerebral por imagem. Assim, há como saber se a enfermidade está mais precoce ou avançada. O que trará muitos benefícios no controlo dos sintomas.
Nós sabemos, também, que o consumo de café, sem exageros, oferece benefícios. Poucas doses por dia, como duas ou três, podem ter efeitos positivos em alguns circuitos do cérebro.
Por fim, o tratamento por imunoterapia, que já atrai muito investimento, é uma enorme esperança para o paciente com Alzheimer.
Atualizado em 19/05/2020.